Existe muito barulho, ruído até, com cada acção, tweet ou boca do Presidente Trump. Especialmente este debate infindável sobre a era do pós-verdade é especialmente maçador, irritante e inconsequente até porque não há pós-verdade: há verdade, há mentira, há jornais que escrevem verdades, há jornais que escrevem mentiras, há pessoas que acreditam no que está escrito nos jornais, há pessoas que têm sentido crítico para ler o que está escrito nos jornais e há pessoas que acham que seria tudo melhor sem jornais. Mas para lá dessa espuma dos dias, dos ataques e dos insultos, pareceu-me especialmente certeiro o único pedido que Barack Obama diz ter feito ao seu sucessor, confessado na entrevista ao programa "60 Minutes" da CBS.
É um pedido particularmente importante porque para lá das opções políticas, legítimas ou mais discutíveis, que um Presidente democraticamente eleito tem o direito de pôr em prática (e que podem ser revogadas pelo seu sucessor ou travadas no Congresso como Obama bem sabe), existem as instituições que são o garante de um Estado de direito democrático. Num sistema de separação de poderes o mais importante é que as instituições judiciais, como o Supremo Tribunal, ou legislativas, como o Congresso, mantenham uma aura de respeitabilidade ao olhos dos cidadãos. São essas instituições que se vão manter, é isso que tem que ser preservado a todo o custo, porque se a Democracia é aceitar as opções políticas legítimas dos cidadãos, também é um conjunto de formalismos e normas que, como diz Obama e muito bem, têm uma razão para existir.
Por vezes fico na dúvida se ainda existe a América de Steinbeck e Springsteen. Ou se o Nobel de Dylan é apenas uma condecoração póstuma que homenageia uma obra que versa sobre algo que já não existe realmente.
Para minha grande surpresa, decobri num post do Delito de Opinião sobre Hemingway que, numa viagem do escritor por Hong Kong, este terá conhecido personagens tão incontornáveis e antagónicas como Zhou Enlai e Chiang Kai-Chek. Ainda mais surpreendido fiquei quando percebi que existe um filme da HBO, centrado na história de amor entre Hemingway e Martha Gellhorn (Clive Owen e Nicole Kidman), em que a cena do encontro com Zhou é retratada.
Se entendi bem, esta viagem ocorreu durante a época em que uma China dividida entre nacionalistas e comunistas se opõe ferozmente à invasão nipónica. É fantástico que uma personagem como Hemingway, uma celebridade no seu tempo, possa ter conhecido o Generalíssimo Chiang e um revolucionário como Zhou, mais tarde Primeiro-Ministro e braço direito de Mao durante os anos negros do Grande Salto em Frente e da Revolução Cultural. Zhou é um político especialmente interessante, caso típico de como preto e branco se confundem em ténues tons de cinza, que descobri primeiro pelos relatos de Kissinger e depois pela sua biografia The Last Perfect Revolutionary; este livro dava para aí uns 10 posts sobre a mais refinada intriga e maquinação política.
Reza a história que o casal Hemingway terá ficado extremamente impressionado com a lucidez e inteligência de Zhou, atributos que lhe eram reconhecidos de forma mais ou menos consensual por amigos e inimigos, e convencidos de que os comunistas acabariam por prevalecer na China.
Numa altura em que se tem debatido bastante o Brexit, o referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia e as cedências negociais que David Cameron tenta usar para defender o "Sim", parece existir um pouco a ideia de que uma UE sem UK seria algo vazio de sentido. Embora fosse sem dúvida um enfraquecimento enorme dessa coisa anacrónica, amorfa e idefinida que dá pelo nome de política externa europeia, importa ainda assim lembrar que historicamente o eurocepticismo é um pilar essencial da política externa britânica para quem os EUA sempre foram o seu natural e mais importante aliado. Com efeito, a única preocupação britânica sempre foi impedir uma posição estratégica hegmónica de qualquer uma das potências continentais, França ou Alemanha, e sempre foi esse o critério para avaliar a necessidade de intervenções militares.
No pós-Guerra, foi Churchill quem cunhou o termo Estados Unidos da Europa e envidou esforços para promover uma Europa unida que, na sua percepção, era o contrapeso mais importante para deter a ameaça comunista da União Soviética. Apesar disso a sua posição sobre a Europa nunca foi entusiástica, como o próprio admitiria:
Much later, in the House, he needed only eight words to state his position on continental Europeans and their drift toward unity: “We are with them, but not of them.
Um pouco como aquela frase que se atribui muito à esquerda intelectual sobre o povo: sempre ao lado do povo mas nunca no meio dele.
Na TVI24 o jornalista Henrique Garcia entrevistava a autora de um livro, cujos nomes já não apanhei, sobre a Lisboa dos anos 70. Para lá dos cinemas, cafés ou personagens em destaque, chamou-me a atenção a parte da conversa que incidiu no PREC. Confessava a autora que apesar de toda a pesquisa não conseguia ter uma ideia precisa sobre os conturbados tempos do pós-revolução. A princípio achei a ideia estapafúrdia mas depois percebi que quem não viveu in loco esses dias não pode ter de facto uma ideia sobre o clima vivido na cidade: além das conspirações e tentativas constantes de golpes de estado que pairavam durante o Verão Quente de 75, havia ainda uma inflação galopante, escassez de bens nas lojas e até atentados à bomba perpetrados por grupos radicais de esquerda e direita.
Assim, chego também à mesma conclusão da autora, não conseguindo imaginar toda a situação vivida nesses tempos. Acrescento no entanto que é um exercício essencial para se perceber o real valor do 25 de Abril, de tudo aquilo que fez nascer, de bom e de mau, na sociedade portuguesa. Apesar das constantes declarações de amor dos velhos do Restelo aos tempos da Outra Senhora, tenho para mim que o balanço é muito positivo. Ou nas sábias palavras de Sophia:
Ao ler I Married A Communist (sim, em inglês. Não porque seja pretensioso ou arrogante mas porque de facto li em inglês - noto agora que esta ressalva dá um ar mais snob a tudo isto....fixe!) é impossível não reparar numa certa tendência de ser polticamente incorrecto, o que é especialmente refrescante numa altura em que todas as opiniões são relativamente uniformizadas e, diariamente, são feitos apelos ao consenso, indo contra aquilo que é no fundo a política. Na verdade, a simples 2ª Lei da Termodinâmica explica que é na morte que tudo tende para a uniformidade; mas pronto, a incultura (a partir do momento em que inverdade é um termo com espessura política sinto-me livre para os neologismos) dos agentes políticos na área da Física não os deixa perceber estas coisas.
No entanto, não é isso que interessa ao caso. Foi apenas um prolegómeno com o objectivo de demonstrar que também eu tenho uma capacidade crítica sobre a sociedade, denotando um espírito lúcido e sagaz na incessante luta pela Verdade e pelo Conhecimento de que é feita a minha vida. Ah e que consigo articular isso com conceitos físicos que não compreendo.
Enfim, o que me pareceu realmente interessante foi o facto de Roth colocar em oposição dois conceitos: a política como "the great generalizer" em oposição à literatura como "the great particularizer"; a tarefa do Escritor é realçar as nuances e procurar nas contradições a essência do ser humano. O caos é uma necessidade do Escritor; caso contrário está apenas a produzir propaganda. No entanto, a natureza intrínseca do particular é falhar em conformar, em uniformizar.
Será por isso que os regimes totalitários não toleram a liberdade literária e preferem a propaganda?
"Generalizing suffering: there is Communism. Particularizing suffering: there is literature."
A vida política de Mao Zedong desenvolveu-se numa encruzilhada entre a ideologia da revolução permanente e a détente como forma de sobrevivência num cenário internacional de Guerra Fria. É interessante perceber como, em determinadas circunstâncias, é difícil fazer política de bom senso em consonância com príncipios que são sempre vistos como pilares absolutos e inquestionáveis. Em larga medida, foi a opção pela ideologia que impulsionou Mao para os desastres do Grande Salto para a Frente (ou para a Fome) e da Revolução Cultural. No lado oposto do espectro, foi a realpolitik (opondo claramente o seu comunismo com o desprezado imperialismo norte-americano) que o levou a abrir-se aos EUA como forma de fazer frente à URSS. De facto, um dos pontos prévios das conversações conduzidas entre Henry Kissinger (conselheiro de Seguranção Nacional na administração Nixon) e Zhou Enlai (primeiro ministro chinês e principal braço direito de Mao), foi a afirmação dos ideais políticos de cada um e como esse não poderia ser um entrave ao diálogo.
Numa transição dramática, violenta e provavelmente despropositada, serve esta introdução para tentar perceber as opções e a visão estratégica do Orçamento de Estado para este ano. Pedro Passos Coelho apareceu como um suposto liberal; chegado ao Governo, tomou opções liberais como o aumento de impostos e a privatização indiscriminada de empresas. No entanto, as reformas que seriam expectáveis no Sistema de Segurança Social têm sido proteladas e substituídas por medidas conjunturais de circunstância.
Ao que parece, em Portugal, já não há ideologia nem sequer uma política de bom senso que faça as reformas necessárias independentemente de pressupostos ideológicos. Há uma política de remendos, ao sabor do vento, e já não é mau.
Numa altura em que a tensão na Coreia do Norte atinge mínimos históricos, cumpre o meu papel de bom cidadão dar uma sugestão para a resolução do conflito. A exemplo do que fizeram Khrushchev e Nixon em 1959, sugiro que o Quim da Coreia do Norte e o seu homólogo do Sul se reúnam em torno de uma pia de cozinha, delineando aí as cláusulas, compromissos e cedências para que se estabeleça uma paz mundial duradoura.