Há muitos anos lia um artigo na super interessante revista "Super Interessante" em que falavam para lá de teletransporte e de como o entrelaçamento quântico entre partículas era um passo nesse sentido. Anos corridos e ainda tenho de ir a correr para o metro senão não há produção que leve este país para a frente. Enfim já sabemos que isto da Ciência é só bugiganguice para enganar o incauto do proletário na sua busca incessante de optimizar o seu processo produtivo.
Serve esta introdução, como me parece evidente, para chegarmos aos fabulosos Pink Floyd. A propósito do regresso do David Gilmour a Pompeia, lembrei-me de como o filme Live at Pompeii (1973) capta os Pink Floyd num ponto de rebuçado que geralmente é ofuscado pelas alturas insanas de Dark Side of The Moon (1973) ou The Wall (1979). Na verdade o concerto de Pompeia é um conjunto tremendamente sólido de músicas da fase mais psicadélica e experimental da banda antes de chegaram a terrenos mais progressivos e conceptuais. Quanto ao entrelaçamento, esse está lá e tem o expoente máximo em Careful With That Axe Eugene, uma música absolutamente hipnótica, num crescendo imparável até à erupção e acalmia, traçando um paralelo assombroso com a história de Pompeia. Um momento absolutamente mediterrânico (é impossível não imaginar a Acrópole e a Esfinge) dos moços londrinos. É essa ligação trascendental entre a música, a história, o local e a estranheza de tocar para um anfiteatro vazio que faz a magia deste concerto.
Down, down. Down, down. The star is screaming. Beneath the lies. Lie, lie. Tschay, tschay, tschay. Careful, careful, careful with that axe, Eugene. The stars are screaming loud.
Mais do que a musica certinha e irritantemente bonita do recente Louder Than Words, a essência dos Pink Floyd é mais ter a música como o pano de fundo para uma mensagem (mais política ou mais poética consoante a ponta do espectro dos anos 70 em que se pegar) e nunca como um fim em si mesmo. Foi aliás neste equilíbrio precário que os britânicos construíram as suas obras primas mais consensuais como Dark Side Of The Moon ou Wish You Were Here; e foi quando este equilíbrio desapareceu em favor da preponderância da letra que se zangaram as comadres e se separou a dupla Gilmour/Waters.
Foi desta última fase dos Pink Floyd (antes da ressurreição de A Momentary Lapse Of Reason) que saiu um álbum monumentalmente esquecido pelo meio das obras de maior sucesso, The Final Cut. Um álbum conceptual anti-guerra (numa altura em que se lutava a Guerra das Malvinas) onde Roger Waters acaba por exorcizar todos os demónios remascentes desde a morte do seu pai na 2ª Grande Guerra. Uma das músicas mais atípicas é mesmo Not Now John, a única do disco cantada por David Gilmour.
É um trabalho que vale a pena conhecer, rock clássico tocado de forma suprema e com elegantes passagens de orquestra sendo uma continuação natural do famoso The Wall, constituindo-se no entanto como um álbum independente e que se mantém por si próprio com canções inesquecíveis como Gunner's Dream ou Two Suns In The Sunset.
O filme Live at Pompeii dos Pink Floyd mostra a banda no culminar de uma fase musicalmente tortuosa que começa no psicadelismo hardcore de The Piper at the Gates of Dawn e passa pelo progressivo mais arrebatado (e pomposo segundo Gilmour) de Atom Heart Mother ou pelo experimentalismo de Ummagumma, até chegar a este ponto que considero uma síntese perfeita de todos estes elementos.
Foi o final da fase mais anónima dos Pink Floyd, antes de atingirem o sucesso mundial com The Dark Side of the Moon. No entanto, todos os elementos que potenciariam este sucesso já lá estavam e muitos evidentes por exemplo em Echoes. É o primeiro ponto de absoluta perfeição de uma banda que ainda voltaria a atingir estes píncaros mais algumas vezes e de maneiras diferentes.
Este concerto são os Pink Floyd sem encenações, luzes, paredes e vícios do sucesso. Apenas uma banda com um conjunto sólido de canções que aqui se transcendem em óptimas versões.
Tremo quando olho para a capa do tão aguardado The Endless River dos Pink Floyd. O desenho clean faz-me lembrar a fotografia do filme "A Vida de Pi" que servia apenas para esconder a banalidade atroz da história. Esperemos que as músicas aqui não me desiludam.
Aparentemente o excelso David Gilmour vai lançar um novo disco em 2015. Embora o "On An Island" seja tudo aquilo que eu menos gosto no Gilmour, nomeadamente a falta de acutilância e o pacifismo latente e conformado que me interfere com os nervos, é sempre de assinalar quando um tipo dos Pink Floyd faz qualquer coisa. Embora não tenha grandes expectativas tenho a certeza de que será música muito bem tocada e que certamente evocará alguns dos grandes momentos dos Pink Floyd. E só por isso já valerá a pena!
Quanto à digressão, espero que não seja algo do tipo "Remember That Night" onde se limitou a tocar no Reino Unido. As primeiras informações não são animadoras ("a digressão não terá umas 200 datas... vai ser uma coisa de velhote" - David Gilmour) mas fica sempre a esperança de ainda o ver ao vivo. Serviria como segunda parte do concerto do The Wall que tive oportunidade de ver, completando assim uma espécie de concerto dos Pink Floyd.
Numa perspectiva mais animadora, tendo em conta o amor dos velhotes ingleses ao Sol e ao vinho português livre-se de não vir cá tocar umas musiquitas para nós!
Os Pink Floyd versão David Gilmour (pós-1984) mantiveram uma coerência assinalável ao nível da componente musical e melódica das canções, seguindo muito as linhas orientadoras do álbum Wish You Were Here; as letras no entanto sofreram um abalo considerável com a saída de Roger Waters, a única verdadeira alma inconformada da banda. Isto é particularmente visível em músicas como On The Turning Away ou A Great Day For Freedom (de um politicamente correcto absolutamente confrangedor) ou Dogs Of War (um spin off embaraçoso do passado glorioso de Animals).
Apesar disso ainda existem algumas réstias de classe no meio do campo conceptual estéril em que se baseiam os discos Momentary Lapse of Reason e The Division Bell. Especialmente este último reflecte algumas ideias sobre a comunicação entre as pessoas que me parecem especialmente pertinentes numa altura em que a era da informação está cada vez mais acelerada e os Homens cada vez mais isolados.
O tema Keep Talking, com a participação do físico inglês Stephen Hawking, expressa a dificuldade de interacção de um indivíduo isolado, a sensação definida em inglês como alone in the crowd e a forma como isso condiciona a resolução quotidiana de conflitos. Hawking volta a participar em The Endless River novo disco dos Pink Floyd que será lançado algures até ao fim do ano. Fico à espera para ver a pertinência da mensagem destinada à voz computorizada de Hawking.
It's more of a wish [that all problems can be solved through discussion] than a belief. (David Gilmour, 1994)
É difícil não gostar de uma música onde a frase "Would you like to learn to fly?" não tem qualquer significado poético/piroso do género aprender o que é a vida, o crescimento pessoal e tretas dessas. É apenas uma expressão que significa: "Ou tás calada ou saltas pela janela e vais dar ao rés-do-chão pelo caminho mais curto."
Pouco gente previu um grande futuro a uns tais de Pink Floyd quando em 1967 lançaram o seu 1º single, "Arnold Layne", em que, desde logo, abordavam as grandes questões e bizarrias da Vida: a história de um travesti decadente (Arnold Layne) que tem o estranho hábito de roubar roupa de senhora dos estendais. É, aparentemente, uma letra baseada em experiências vividas pelas mães de 2 elementos - Roger Waters e Syd Barret. Enfim, estes ingleses, a escrever músicas tudo lhes serve para reflexão. Ou tendo em conta que eram os anos 60, possivelmente LSD a mais a correr nas veias.
Em 2006, o próprio David Gilmour deu-se ao trabalho de voltar a tocar a música e convidou uma das poucas pessoas a quem se pode dizer que a música assenta como uma luva sem ser um insulto: David Bowie. Daí resultou esta versão bastante fiel à original mas sem soar tão datada.
Sendo português, tendo a identificar-me pouco com algumas das características que são geralmente apontadas como tipicamente portuguesas nomeadamente o amor doentio pela saudade e o facilitismo (ou facilidades?) que percorre transversalmente toda a sociedade, seja no trabalho, negócios, ensino e tudo mais.
Na preparação do Dark Side of the Moon, Roger Waters entrevistou várias pessoas acerca de coisas como comida preferida, último episódio de violência, cor favorita, etc. Sempre de modo a perseguir as questões fundamentais abordadas nas letras do álbum: dinheiro, loucura, isolamento, morte.
As melhores respostas, podem-se ouvir em Breathe e Eclipse e são da autoria do porteiro dos estúdios de Abbey Road que, curiosamente, era irlandês. Destaca-se a frase que encerra o álbum: There’s no dark side of the moon really. As a matter of fact it’s all dark. Este pessimismo anteriano (expressão curiosa que ouvi uma vez a Pedro Mexia no Governo Sombra) sempre foi algo que associei aos ingleses. Sempre cépticos (União Europeia o que é isso?), sempre pragmáticos, sempre derrotistas.
Também em Time, transparece uma sensação de cansaço, resignação e desistência. Em particular, o verso Hanging on in quiet desperation is the English way revela também o estoicismo e resume a calma como encaram a velhice, o fim da vida e a sensação de falhanço com que se faz a sua retrospectiva. Talvez tenha uma costela britânica afinal.
Um dia que viaje para o estrangeiro, ao chegar ao aeroporto, pretendo entoar bem alto a minha própria versão de "Young Lust". Apresento-me como um bom rapaz (I am just a new boy), desconhecedor das redondezas (Stranger in this town), com vontade de conhecer (Where are all the good times?), à procura de um guia turístico (Who's gonna show this stranger around?) e com uma mente algo doentia (I need a dirty woman).
Qual das seguintes espécies beneméritas me abordará primeiro?
A: Um mânfio simpático que me subtrai os parcos trocos que conto levar e possivelmente um rim, abandonando-me numa banheira cheia de gelo.
B: Uma profissional liberal do sexo feminino cuja actividade profissional é isenta de impostos e que responde directamente à minha interpelação.
C: Um taxista que acede amavelmente a conduzir-me ao centro da cidade na perspectiva de me fazer passar inadvertidamente pelo resto do país primeiro.
No capítulo seguinte ("One Of My Turns"), o autor parece sugerir a resposta B. Envolvendo no entanto a banheira, a contemplação de uma auto-estrada e a possibilidade de aprender a voar através de uma janela.