Para mim os Red Hot Chili Peppers começaram por ser a banda do Californication e de tudo o que veio a seguir até ao Stadium Arcadium. Nesta fase eram uma banda com os dois pés bem fincados no rock alternativo, com ecos distantes do funk de álbuns como Mother's Milk ou da mistura em ponto-de-rebuçado de Blood Sugar Sex Magic. Ainda assim, é interessante lembrar que na sua génese os Red Hot foram buscar muito ao movimento punk de Los Angeles e era muito mais esse o estilo inicial particularmente influenciado pelo seu primeiro guitarrista, o malogrado Hillel Slovak.
Assim, e a propósito de um dos livros interessantes que li nos últimos tempos, a biografia do Anthony Kiedis, vocalista da banda, tenho redescoberto algumas das músicas mais antigas e a propósito de Subway to Venus tive que me recordar de uma frase auspiciosa que Kiedis proferiu quando o baixista Flea se quis despedir da banda por causa das espiral de consumo de drogas em que este se encontrava.
Apesar dos preços desgraçados da última Feira do Livro, a remessa de livros que veio comigo para casa foi ainda assim um bocado acima do que estava planeado: culpo o local conveniente onde realizam o certame e falta de coisas melhores para fazer do que andar a ver as estantes todas com um pormenor de irritar a paciência a Cristo.
Cristo que, já agora, é personagem principal (ainda que nunca presente em corpo) da maior tragédia financeira deste ano, um lindo volume do clássico russo Os Irmãos Karamázov. Embora Nosso Senhor não tenha culpa que eu tenha cedido ao pecado da ganância e da luxúria literária, é agora o principal protagonista de um livro que me está a surpreender pela sua densidade absolutamente atroz: está mais perto de ser um livro de filosofia do que um romance moral ao estilo de Crime e Castigo, por exemplo. Em comparação com este último, tem a desvantagem de que todas as personagens são feias, porcas e más de alguma maneira; não há li ninguém verdadeiramente puro e recomendável (Aliocha Karamázov, estou para ver o que vai ser da tua virtude e castidade que me parecem tão supostas!); uma coisa é certa, neste livro ninguém encontra um banana como o Príncipe Myshkin ou um idiota (que trocadilho magnífico) como Raskolnikov que sofre como uma cão pela redenção dos seus pecados.
Um livro que mistura deboche com teologia; amor fraternal e existencialismo. Para si Fyodor, com um abraço deste seu fã que ainda vai a meio do livro:
Existem algumas músicas que chegam de uma forma qualquer aleatória no Youtube e que passam sem deixar grande coisa. Este é mais uns desses casos mas que escolhi colocar aqui por duas razões.
1 - Porque é um nome espectacular para uma banda. Ainda melhor para se procurar no Google. Especialmente se não gostarem de música.
2 - Porque existe uma rima divertida entre o nome da música "Mind Control" e a cavalgada opressiva do baixo e da guitarra, omnipresentes ao longo de toda a música.
Numa altura em que os Red Hot Chili Peppers voltam em grande forma às digressões com o seu novo álbum The Getaway, recheado de grande músicas como a canção-título, "Dark Necessities" ou "Goodbye Angels", é interessante olhar um pouco para as origens do actual guitarrista Josh Klinghoffer. O talento é inegável mas por vezes ficava a irritante sensação de que a banda não confiava nele o suficiente, mantendo-o com um volume baixo tanto na guitarra como na voz.
Parece que com este novo álbum, Josh Klinghoffer passou a ser um membro de facto da banda e aumentaram o volume ao homem já sendo possível ouvir a sua guitarra frenética e os seus peculiares backing vocals que, num estilo diferente do John Frusciante, oferecem belíssimas versões dos clássicos dos Red Hot.
A colaboração entre Klinghoffer e Frusciante já vem de há longo tempo sendo que um dos momentos mais altos foi o projecto Ataxia que em duas semanas gerou o material necessário para dois álbuns, Automatic Writing (2004) e AW II (2007). O primeiro álbum em particular é uma pérola perdida do rock alternativo, a descair para o psicadélico, com uma trovoada de guitarras de um Frusciante completamente à solta e num grande momento de forma.
Consolemo-nos com "Dust", numa das 2 vezes que a banda actuou ao vivo, numa altura em que a carreira do Frusciante parece mais virada para as electrónicas (menos para as guitarras) e o Klinghoffer se tornou finalmente num guitarrista à altura dos Red Hot.
Pessoa pacata que sou, tendo a desconfiar de estilos agressivos como death metal, black metal e outras coisas que tais. Parece-me muito barulho, saltos e gritos para nada. Tudo isto me passou quando travei conhecimento com o suave colectivo norueguês que dá pelo nome de Opeth. Comecei com alguma batota, pelos temas mais suaves e instrumentais como "Harvest" ou "Hope Leaves".
O ponto que me espanta sempre mais é a calma, fleuma e veia humorística do vocalista Mikael Åkerfeldt. O tipo passa as músicas a berrar de forma espectacular e depois pelo meio fica extremamente calmo a contar anedotas. Essa tranquilidade passa muito para o público que está por ali e, no máximo, abana a cabeça sem se mexer muito mais. É impressionante mas fui ver Opeth sem ser pisado, empurrado ou alguém se ter metido à minha frente. Nunca me aconteceu no Rock In Rio ou no Alive por exemplo. Bom, termina-se isto com "Bleak" a minha música preferida, do meu álbum preferido "Blackwater Park".
Há muitos anos lia um artigo na super interessante revista "Super Interessante" em que falavam para lá de teletransporte e de como o entrelaçamento quântico entre partículas era um passo nesse sentido. Anos corridos e ainda tenho de ir a correr para o metro senão não há produção que leve este país para a frente. Enfim já sabemos que isto da Ciência é só bugiganguice para enganar o incauto do proletário na sua busca incessante de optimizar o seu processo produtivo.
Serve esta introdução, como me parece evidente, para chegarmos aos fabulosos Pink Floyd. A propósito do regresso do David Gilmour a Pompeia, lembrei-me de como o filme Live at Pompeii (1973) capta os Pink Floyd num ponto de rebuçado que geralmente é ofuscado pelas alturas insanas de Dark Side of The Moon (1973) ou The Wall (1979). Na verdade o concerto de Pompeia é um conjunto tremendamente sólido de músicas da fase mais psicadélica e experimental da banda antes de chegaram a terrenos mais progressivos e conceptuais. Quanto ao entrelaçamento, esse está lá e tem o expoente máximo em Careful With That Axe Eugene, uma música absolutamente hipnótica, num crescendo imparável até à erupção e acalmia, traçando um paralelo assombroso com a história de Pompeia. Um momento absolutamente mediterrânico (é impossível não imaginar a Acrópole e a Esfinge) dos moços londrinos. É essa ligação trascendental entre a música, a história, o local e a estranheza de tocar para um anfiteatro vazio que faz a magia deste concerto.
Down, down. Down, down. The star is screaming. Beneath the lies. Lie, lie. Tschay, tschay, tschay. Careful, careful, careful with that axe, Eugene. The stars are screaming loud.
Numa altura de pré-campanha eleitoral nos Estados Unidos é algo preocupante perceber como a democracia não encerra em si própria uma garantia de liberdades individuais de pensamento, culto ou circulação. Não é um garante sequer de um sistema político representativo e forte na defesa dos valores essenciais. É aquilo que os eleitores querem que seja e é assim que deve ser.
No entanto, embora seja tão divertido insistir na dualidade entre a lunaticidade de Trump e nas ligações sombrias de Clinton, eu prefiro continuar a olhar para a melhor América e acreditar na sua tradição de terra da liberdade, sonhos e oportunidades. Nesse sentido, não será surpreendente que seja um admirador de Springsteen e das suas músicas que narram as histórias quotidianas das dores de crescimento na América dos anos 60 com um enlevo poético sem se tornar intelectual; optimista sem ser pateta alegre; crítico sem ter palas revolucionárias
A luta da classe operária (não, isto não é um panfleto comunista enfeitado com um bonito panegírico à democracia da Coreia do Norte) e o esmagar de sonhos do quotidiano é um tema predominante em "The Promised Land", por exemplo, mas sempre de uma forma estóica e nunca depressiva.
I've done my best to live the right way I get up every morning and go to work each day But your eyes go blind and your blood runs cold Sometimes I feel so weak I just want to explode Explode and tear this town apart Take a knife and cut this pain from my heart
Gonna be a twister to blow everything down That ain't got the faith to stand its ground Blow away the dreams that tear you apart Blow away the dreams that break your heart Blow away the lies that leave you nothing but lost and brokenhearted
Esta insignificância fez-me sempre associar as letras de Springsteen às letras de Steinbeck que também dão um destaque superlativo à luta diária do homem comum. Essa enorme capacidade de percepção das questões sociais e a acutilância com que as abordam, desprezando igualmente ocas revoluções e alienações colectivas, sempre me pareceram aproximar imenso o músico e o cantor. Assim, foi com alguma naturalidade que descobri o álbum "The Ghost of Tom Joad", levemente baseado na personagem principal de "As Vinhas da Ira". É um álbum acústico, coisa que à partida me afasta porque acho que é preciso um talento muito raro para cativar apenas com voz e guitarra (o mesmo se aplica no fado), mas músicas como "Youngstown" ou "Straight Time" deitam abaixo qualquer cepticismo.
No entanto, é a música que dá nome ao álbum que mais se destaca em particular por transpôr de uma forma tão nítida aquilo que imaginei ao ler o livro de Steinbeck. Uma letra rica em imagens quase cinematográficas e uma apologia do activismo social no melhor sentido da expressão.
Men walking 'long the railroad tracks Going someplace, there's no going back Shelter line stretching 'round the corner Welcome to the new world order Families sleeping in the cars in the southwest No home, no job, no peace, no rest
Now Tom said, "Mom, wherever there's a cop beating a guy Wherever a hungry newborn baby cries Where there's a fight against the blood and hatred in the air Look for me, Mom, I'll be there Wherever somebody's fighting for a place to stand Or a decent job or a helping hand Wherever somebody's struggling to be free Look in their eyes, Ma, and you'll see me"
Um aspecto que pesa cada vez na minha apreciação dos filmes que vejo é a banda sonora. É um vício do qual me apercebi à medida que me embrenhei na obra de Quentin Tarantino e imergi naquele emaranhado de músicas série D, há muito esquecidas mas com um papel memorável em algumas cenas. Como esquecer "Down In Mexico" em Death Race ou "Don't Let Me Be Misunderstood" no Kill Bill?
Uma música à qual associo cinema é sem dúvida "Gimme Shelter" dos Rolling Stones, em especial os filmes de polícias e bandidos de Martin Scorcese: Casino, Godfellas e o meu favorito The Departed. Apesar de ser uma das minhas músicas preferidas, apenas descobri recentemente a trágica histórica da sua gravação.
Reza a história que os Stones estavam por Los Angeles em 1969, uma época particularmente violenta e rica em tumultos sociais, e precisavam de uma voz feminina para gravar o refrão de Gimme Shelter: Rape, murder/It’s just a shot away!
There are some guys in town from England. And they need someone to come and sing a duet with them, but I can’t get anybody to do it. Could you come?
Apesar da hora tardia e do estado avançado de gravidez, Merry Clayton lá foi até ao estúdio e gravou uma impressionante performance vocal que fica para a história.
Despite giving what would become the most famous performance of her career, it turned out to be a tragic night for Clayton. Shortly after leaving the studio, she lost her baby in a miscarriage. It has generally been assumed that the stress from the emotional intensity of her performance and the lateness of the hour caused the miscarriage.
Um dos filmes mais interessantes que vi nos últimos tempos foi "A Most Violent Year" sobre a onda de criminalidade que varreu a cidade de New York nos anos 80. O filme não é brilhante e vale sobretudo pelos papéis desempenhados por Oscar Isaac e Jessica Chastain. A sequência de abertura mostra o protagonista, um empresário ambicioso interpretado por Isaac, a correr pelos perigosos subúrbios sobre um pano de fundo musical que desconhecia, "Inner City Blues" uma canção de 1971, interpretada por Marvin Gaye. Chamou-me a atenção a música e, mais tarde, tomei alguma atenção à letra:
Crime is increasing Trigger happy policing Panic is spreading God know where we're heading
Talvez em Portugal não se tenha chegado a este nível mas fez-me pensar um pouco no papel da polícia na sociedade e em confrontos como os que ocorreram em Jacksonville, por causa de tensões raciais, ou no Brasil, em resposta à crise política desencadeada pela operação Lavajato.
Se há estilo de música que não me assiste por completo é o punk, entendido na sua forma mais canónica, de bandas como os Sex Pistols ou os Ramones. Numa categoria especial coloco os Clash pela pertinência da mensagem passada mas também porque a nível musical, além de serem muito mais evoluídos do que os três acordes das restantes bandas punk, incluíam outros elementos ska, funk ou reggae que conferem uma diversidade completamente diferente às suas músicas.
Contradizendo o que acabo de dizer, esta música é um cover dos Ramones com uma letra bastante política saída do caldeirão da invasão da Baía dos Porcos, da tensão entre o regime militar de Baptista e os revolucionários de Castro e do processo recrutamento de espiões cubanos pela CIA. De resto, e como qualquer moço criado nos anos 90, tenho uma veneração pelos Red Hot do Californication, do sempre presente baixo do Flea mas, acima de tudo, da guitarra mágica do John Frusciante.
Parece-me adequada à actualidade da visita do Presidente Obama a Cuba e tinha ficado bem aos Rolling Stones (fãs confessos deste humilde blog) tocarem isto no seu primeiro concerto em Havana!
PT-boat on the way to Havana I used to make a living, man Pickin' the banana. Now I'm a guide for the CIA Hooray for the USA!
Baby, baby, make me a loco Baby, baby, make me a mambo.
Sent to spy on a Cuban talent show First stop - Havana au go-go I used to make a living, man Pickin' the banana Hooray for Havana!
Baby, baby, make me a loco Baby, baby, make me a mambo.