Impressionante como uma letra relativamente simples reflecte algo que vejo por vezes em pessoas mais velhas, vencidas ou pelo menos resignadas com a vida. É um fado da Amália Rodrigues, com letra de Silva Tavares, chamado "Que Deus Me Perdoe".
Se a minha alma fechada Se pudesse mostrar, E o que eu sofro calada Se pudesse contar, Toda a gente veria Quanto sou desgraçada Quanto finjo alegria Quanto choro a cantar...
Cada vez mais me convenço que existe em cada português algo que o atrai inevitavelmente ao fado. É um fenómeno que provavelmente se pode explicar pelo condicionamento que sofremos desde pequeninos, especialmente agora que o fado está definitivamente na moda, com a música a passar nas televisões bastante amiúde. Mas a um nível mais inconsciente, há algo no fado que me deixa especialmente triste, nostálgico e com saudades de um Portugal, ali de meados do século XX, que provavelmente nunca existiu senão na minha cabeça; a Lisboa dos filmes do Vasco Santana é se calhar a melhor aproximação existente. Não se pense com toda esta conversa que sou um grande apreciador do género; dizia alguém que sendo uma música tão crua, é frequentemente má porque exige momentos de inspiração quase divina ao intérprete. Talvez seja esse o meu problema com o fado. Contam-se pelos dedos das mãos (literalmente) os fados de que gosto. Mas esses de facto enchem-me as medidas.
Ó desventura, ó saudade, Causas da minha inconstância