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Zanadu!

Crónicas de Timbuktu, Trevim e Lisboa (nos melhores dias)

Zanadu!

Crónicas de Timbuktu, Trevim e Lisboa (nos melhores dias)

Acerca da Boa América

por Tiago, em 18.06.16

Numa altura de pré-campanha eleitoral nos Estados Unidos é algo preocupante perceber como a democracia não encerra em si própria uma garantia de liberdades individuais de pensamento, culto ou circulação. Não é um garante sequer de um sistema político representativo e forte na defesa dos valores essenciais. É aquilo que os eleitores querem que seja e é assim que deve ser.

No entanto, embora seja tão divertido insistir na dualidade entre a lunaticidade de Trump e nas ligações sombrias de Clinton, eu prefiro continuar a olhar para a melhor América e acreditar na sua tradição de terra da liberdade, sonhos e oportunidades. Nesse sentido, não será surpreendente que seja um admirador de Springsteen e das suas músicas que narram as histórias quotidianas das dores de crescimento na América dos anos 60 com um enlevo poético sem se tornar intelectual; optimista sem ser pateta alegre; crítico sem ter palas revolucionárias

A luta da classe operária (não, isto não é um panfleto comunista enfeitado com um bonito panegírico à democracia da Coreia do Norte) e o esmagar de sonhos do quotidiano é um tema predominante em "The Promised Land", por exemplo, mas sempre de uma forma estóica e nunca depressiva.

I've done my best to live the right way 
I get up every morning and go to work each day
But your eyes go blind and your blood runs cold
Sometimes I feel so weak I just want to explode
Explode and tear this town apart
Take a knife and cut this pain from my heart

Gonna be a twister to blow everything down
That ain't got the faith to stand its ground
Blow away the dreams that tear you apart
Blow away the dreams that break your heart
Blow away the lies that leave you nothing but lost and brokenhearted

Esta insignificância fez-me sempre associar as letras de Springsteen às letras de Steinbeck que também dão um destaque superlativo à luta diária do homem comum. Essa enorme capacidade de percepção das questões sociais e a acutilância com que as abordam, desprezando igualmente ocas revoluções e alienações colectivas, sempre me pareceram aproximar imenso o músico e o cantor. Assim, foi com alguma naturalidade que descobri o álbum "The Ghost of Tom Joad", levemente baseado na personagem principal de "As Vinhas da Ira". É um álbum acústico, coisa que à partida me afasta porque acho que é preciso um talento muito raro para cativar apenas com voz e guitarra (o mesmo se aplica no fado), mas músicas como "Youngstown" ou "Straight Time" deitam abaixo qualquer cepticismo.

No entanto, é a música que dá nome ao álbum que mais se destaca em particular por transpôr de uma forma tão nítida aquilo que imaginei ao ler o livro de Steinbeck. Uma letra rica em imagens quase cinematográficas e uma apologia do activismo social no melhor sentido da expressão.

Men walking 'long the railroad tracks
Going someplace, there's no going back
Shelter line stretching 'round the corner
Welcome to the new world order
Families sleeping in the cars in the southwest
No home, no job, no peace, no rest

Now Tom said, "Mom, wherever there's a cop beating a guy
Wherever a hungry newborn baby cries
Where there's a fight against the blood and hatred in the air
Look for me, Mom, I'll be there
Wherever somebody's fighting for a place to stand
Or a decent job or a helping hand
Wherever somebody's struggling to be free
Look in their eyes, Ma, and you'll see me"

Acerca da infalibilidade dos clássicos

por Tiago, em 04.06.16

Depois de "Orgulho e Preconceito" e "Jane Eyre" que me encheram as medidas de maneiras diferentes, decidi continuar na onda dos clássicos e estrear-me a ler um livro de Joseph Conrad.

À partida, o livro que eu queria ler era o "Coração das Trevas": primeiro porque tenho o livro em formato digital algures perdido no computador; segundo porque fiquei fascinado com o conceito de um coração de África, uma floresta impenetrável que constitui uma barreira física, mental e cultural dificilmente ultrapassável; terceiro, e último, porque me despertou muita curiosidade a descrição de Michael Palin sobre esta zona do rio Congo e do contraste com a região do Transvaal no norte da África do Sul.

Como em muitas coisas, o Fado interveio na pessoa colectiva da CP-Comboios de Portugal e da sua forma arcaica de compra de títulos de transporte para comboios regionais que me fez passar um bonito par de horas na Estação do Oriente a um sábado de manhã. Lá fui espreitar a Feira do Livro, que lá está de forma mais ou menos consecutiva (e ainda bem), e trouxe dois ou três livros, no meio dos quais vinha "O Agente Secreto".

A história passa-se na Londres do final do século XIX e a personagem principal é o indolente Verloc, um agente secreto ao serviço de uma potência estrangeira e parte integrante de um grupo meio anarquista, meio revolucionário. No meio da preparação e execução de um atentado está a vida quotidiana do senhor Verloc, a sua mulher, o seu cunhado e a sua loja de artigos, vá, alternativos.

Além das personagens incaracterísticas, aborrecidas e genericamente indefinidas, a história é pouco convincente, há muito fumo de salões e pouco de explosões. A escrita em si também não me agradou particularmente, achei-a bastante soporífera e confusa. Decerto existirão méritos numa obra que se tornou um clássico e é uma referência do romance policial mas a verdade é que em nenhum momento lhe achei alguma piada e a muito custo a terminei.

Enfim, o pior é que agora fiquei com vontade nula de ler o "Coração das Trevas". Daqui a uns anos, talvez, quando me esquecer deste completo fiasco. Fica apenas uma encantadora descrição da sogra do senhor Verloc, com a qual todos podemos aprender.

Mas não permitiu que as suas apreensões interiores a privassem da vantagem de uma placidez venerável.

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