Com pouco tempo para leituras muito complexas ou exigentes, tenho-me dedicado a livros de história ou biografias de figuras do ciclismo. Tendo em conta que por este mês se correm as clássicas da Primavera, pareceu-me adequado ler "The Monuments" de Peter Cossins: a história das cinco corridas de um dia mais importantes do ciclismo (Liege-Bastogne-Liege, Milan-San Remo, Paris-Roubaix, Ronde van Vlaanderen e o Giro di Lombardia), desde a sua criação, as principais figuras e todo o simbolismo que as rodeia. Uma escrita simples o suficiente para ir lendo umas páginas no Metro sem perder o fio à meada.
Uma das pérolas que desconhecia é a resposta do lendário Jacques Anquetil ao pedido de uma amostra de urina para um controlo anti-doping no final de uma corrida. É este tipo de frase que imortaliza e contribui para a aura lendária dos grandes campeões: tudo o que for politicamente correcto é esquecido muito depressa.
Too late. If you can collect it from the soapy water there, go ahead. I'm a human being, not a fountain.
Anquetil a caminho de Liege na sua única vitória num Monumento.
Num cenário mais ou menos estranho, exótico e adverso para dois americanos como a cidade de Tóquio, sente-se o exacerbar da a solidão dos dois personagens principais que se cruzam numa procura de empatia, acima de tudo. O Japão parece apenas uma metáfora para estilos de vida cada vez mais solitários, tão supostamente sociais mas onde a distância entre as pessoas é sempre e cada vez maior.
As cenas em que Bill Murray telefona para a mulher e a Scarlett Johansson para uma amiga nos EUA são algo que achei especialmente real e até auto-biográfico: ter algo para dizer, não ter ninguém para escutar (apesar de se estar rodeado de pessoas) e lidar com a angústia subjacente; uma demonstração eloquente da expressão "alone in the crowd".
É impressionante a forma como o filme consegue transmitir um conjunto de ideias, principalmente através do subtexto, dos silêncios e do que fica por dizer; tudo assente na química improvável dos dois actores principais. A banda sonora é um mundo à parte com músicas dos Air, My Bloody Valentine e, especialmente, "Just Like Honey" dos The Jesus And Mary Chain. Vale a pena ver sem dúvida.
Se há personagem interessante no ciclismo actual é o sprinter britânico Mark Cavendish; pelas inúmeras vitórias mas acima de tudo pela personalidade refrescante: um atleta tão rápido nos sprints como lento a subir montanhas, sempre consciente do papel da sua equipa nas suas conquistas mas, acima de tudo, alguém excepcionalmente desbocado para a enorme projecção mediática que tem.
O seu desenvolvimento como atleta foi baseado em corridas de pista o que é muito comum em países anglófonos como a Grã-Bretanha ou a Austrália. Para quem está mais por fora destes assuntos, é nos velódromos que estão os matemáticos do desporto que procuram resumir todas as performances dos atletas a um conjunto de números que possam ser continuamente analisados e melhorados. De facto, e em comparação com o ciclismo de estrada, o velódromo é um ambiente excepcionalmente controlado onde é possível isolar variáveis e assim potenciar a performance do ciclista através de modelos fisiológicos mais ou menos complexos.
Assim, e numa época em que equipas como a Sky procuram aplicar estes métodos ao ciclismo de estrada esvaziando-o de tudo aquilo que historicamente fez os grandes campeões (raça, ambição, paixão e capacidade de sofrer), é bonito ver um "discípulo" desta escola ter um discurso tão anti-científico na sua biografia "Boy Racer".
In a sport growing ever more obsessed with science, a kid whose performances on the road simply didn’t seem to translate into watts in the lab was always likely to be confusing and sometimes infuriating. Generally, leading teams were and still are managed by old pros who knew from their own experience that cycling is much too complex to reduce to a mathematical equation, but, in recent years, ironically, cycling has seen sports scientists as the revolutionary soldiers to lead cycling out of its doping crisis.
I was like a bug in his computer which ruined all his sums. I had two things that he couldn’t plot on a graph: passion and an ability to suffer. To me there was no limit. There was no universal rule of cycling except that the bloke who rode fastest won the race.
Hat-trick nos Campos Elísios com a camisola arco-íris de campeão do mundo.